O Miradouro Auditivo
Na Binaural Nodar, o meu plano inicial era construir um ponto de vigia auricular, uma construção que enfatizasse a paisagem sonora da área em vez da paisagem visual. Enquanto olhava as fotos da área, lembrei-me de muitas férias, de pé, no topo de uma montanha, numa plataforma de vigia, apreciando as impressões da paisagem. Embora o som sempre fizesse parte dela, evidentemente, estas plataformas não são feitas para sintonizarem as diferentes experiências sonoras. Ao mesmo tempo, quando acampados ao ar livre, pensamos sempre no sossego e tranquilidade da natureza, até entrarmos num espaço de som diáfano, tal como uma tenda. Subitamente, ainda estando ao ar livre, os sons são amplificados, apenas porque os visuais podem descansar e não podem usar mais previsões. Mesmo à luz do dia, os sentidos trocam a sua importância, não posso ver, por isso escuto.
No início da residência parecia que estávamos numa expedição: eramos apresentados às aldeias, saíamos para inspecionar e procurar materiais e voltávamos para casa à noite a pensar como iríamos agrupar as impressões. Os locais, os seus hábitos diários e as estruturas da aldeia pareciam estar em sintonia com a paisagem. Para mim, esta uniformidade prática juntamente com a localização remota, inicialmente, quase se opôs a qualquer interferencia.
Mas depois de conhecer a área e de me familiarizar com alguns dos habitantes idosos que restavam, comecei a ver diferentes camadas e apercebi-me de que em quase todas as pequenas comunidades existiram, em algum momento, eventos animados. Contudo, a única prova restante disso são os restos arquitetónicos, os estádios vazios e gazebos deteriorados dos centros das aldeias. Quando falei com os aldeões, eles contaram-me acerca do passado, dos cantares e das danças que, na sua memória, costumavam ser um hábito diário e uma importante parte das suas vidas. Foi interessante ver como a arquitetura sobreviveu, mas essas experiências vivas pareciam decair juntamente com as aldeias e os aldeões, cada elemento isolado do outro.
Pedi a vários dos locais mais idosos das diferentes aldeias para cantarem individualmente para mim e, relutantemente, começaram a cantar com vozes frágeis e não exercitadas, lembrando as canções populares da zona. Ser convidado para diferentes casas onde as pessoas timidamente cantavam ou recitavam poesia para mim, foi uma experiência muito honesta e humilde, porque parecia ser algo com que eles já não se conseguiam identificar quando inicialmente lhes dirigi esse pedido. Com o passar dos anos, as pessoas esqueceram algumas das letras, então cantaram ou acompanhavam à boca fechada o que se lembravam. Compus um coro com essas gravações separadas e juntei todos os pedaços numa só canção.
Ao mesmo tempo procurava um lugar para o meu ponto de vigia, explorando a arquitetura da área para ver que forma poderia tomar. Há uma certa confrontação com o estilo de vida pragmático diário e a quantidade quase excessivade capelas e igrejas, que eram dos únicos lugares onde eu ouvia música, também. Para mim, as estruturas práticas e simplistas dos poços de abastecimento de água, não só eram uma personificação dessas rotinas diárias, como também poderiam rivalizar naturalmente com a santidade das igrejas, porque a água levava o som e prendia a reverberação.
A vigia auricular está montada em cima de uma cobertura plana de um depósito, cheio de água para a região, vigiando algumas das aldeias. É uma construção fora da tela que se separa, mas não exclui os arredores montanhosos. Eu queria misturar-me com a funcionalidade simplista e mudar o seu propósito ao mesmo tempo.
A peça de coro étocada emabaixo, usando colinasdentrodo depósito.Andandono interior da vigia auricular, os visitantes ouvemo coro, bem como os seuspróprios passos e vibrações através deauscutadoresconectados a microfonesdentro do depósito,gravando o som diretodascolunase dareverberação.
Na Binaural Nodar trabalhei pela primeria vez com voz e encontrei um diálogo entre a arquitetura, paisagem e os habitantes. O pequeno grupo de artistas e a assistência local foram muito motivantes e encorajadores para trabalhar num espaço especifico. Inicialmente nao estava muito interessada em usar sons humanos no meu trabalho e sinto-me muito satisfeita pelo fato de a minha peça se ter desenvolvido num curto periodo de tempo sendo que foi um ponto de começo para uma investigação futura acerca da voz em relação à arquitetura.
Lisa Premke (1981, Alemanha) estudou inicialmente Arquitetura e mais tarde Belas Artes na Academia Rietveld em Amsterdão. Já enquanto estudava começou a trabalhar aliando Arquitetura ao Som, tendo aprofundado este interesse durante o seu Mestrado em Som na Glasgow School of Arts. As suas instalações de aquitetura sonora de grande escala articulam-se frequentemente com o local, tanto visualmente como audivelmente. Desde há alguns anos que Lisa trabalha também para filmes e peças de audio e organiza exibições e residências artísticas em sítios pouco usuais. Lisa vive e trabalha em Berlin, Alemanha.
OBRAS ARTÍSTICAS