Magaio Voicescapes: Terceiro Ciclo de Residências Artísticas
Freguesias de Candal e Manhouce (concelho de São Pedro do Sul)
12 Setembro a 30 Setembro 2011
Apresentações Públicas: 1 e 2 de Outubro 2011

Artistas Residentes:

Patrícia Azevedo (Brasil) & Clare Charnley (Inglaterra)
Rogério Nuno Costa (Portugal)
Josef Sprinzak (Israel)
Carmina Escobar (México)
Toine Horvers (Holanda) & Myriam Van Imschoot (Bélgica)

A voz é o principal instrumento da comunicação humana. A voz desenha e transmite conteúdos, cria relações entre sujeitos e pressupõe escuta e participação. A voz (a nossa e a dos outros) leva-nos para fora, liberta-nos do peso insuportável da repetição à qual de outra forma seriamos confinados. A voz é som, é símbolo de uma interioridade de outro modo inexprimível. A voz prepara o sentido do lugar onde a palavra se dirá.

A voz é uma força arquétipa, é uma imagem primordial dotada de um poderoso dinamismo criador. É o “lugar” onde a linguagem se articula, que vai além da voz, com toda a sua força existencial, materialidade e significado. “A voz é uma questão ainda não organizada, significante puro e livre que aponta, aludindo e acenando sem dizer. A voz diz-se no momento em que diz: é pura exigência. O grito inarticulado, o gemido puro, a vocalização sem palavras, o grito de guerra, são explosões do ser que se identifica com a sua própria voz: a voz é vontade de dizer e vontade de existir. “(Paul Zumthor)

Na região rural Portuguesa do maciço da Gralheira (Concelho de S. Pedro do Sul), composta por comunidades de montanha em que agricultura e pastorícia de subsistência eram as actividades dominantes, locais onde a electricidade e consequentemente a televisão chegaram há apenas cerca de 30 anos, todo o conhecimento e comunicação tinha como meio a voz humana. Esse facto por si só é suficiente para conferir uma riqueza densa a todo o discurso oral… a idiossincrasia, o desconcertante, o subliminar, os sotaques, aspectos que vão sendo cada vez mais estandardizados.

O programa de residências artísticas Magaio Voicescapes propõe colocar em diálogo todas as formas de património oral rural e formas artísticas contemporâneas centradas na voz (arte sonora, performance, poesia sonora, etc.) que trabalhem aspectos como a origem, o significado, as relações do sagrado (reconduzido ao seu significado e simbolismo ancestral de mistério e símbolo), a voz como elemento na base de rituais, costumes e superstições, capaz de encantar o ouvinte e de trazer mudanças profundas no real, nas comunidades e no território, a voz como protagonista de memórias, mitos, arquétipos, sabedoria popular transmitida ao longo dos séculos, ou ainda a voz quotidiana, ferramenta de trabalho e vida.


Projectos Artísticos:

Patrícia Azevedo (Brasil) e Clare Charnley (Inglaterra)
Projecto Gestosinho

A proposta das artistas é gerar interacções com as pessoas da zona de Manhouce, seu espaço geográfico e social, sua identidade e memória a fim de realizar um poema sonoro, usando pastilhas de áudio vermelhas, como as que se encontram nos brinquedos falantes. Equacionando a força da cultura oral e o facto do mundo rural ainda manter uma relação particular com a paisagem e seus usos, as artistas pensam tecer uma malha poética de realidades materiais e imateriais superpostas. O processo consiste em caminhar gravando nas pastilhas de áudio figuras sonoras encontradas em paisagens e cenas do quotidiano e, posteriormente, convidar as pessoas a escutá-las e a criar uma tradução livre do som para a voz, uma onomatopéia ou figura de linguagem, usando a própria voz, a ser gravada em outra pastilha.

Clare Charnley (UK) e Patrícia Azevedo (BR) trabalham em parceria desde 2007. Usam diferentes mídias – fotografia, áudio, vídeo, performances – para desenvolver projetos que equacionam observações sobre linguagem, território e relações de poder. Localizam os próprios trabalhos não somente nos artefatos | imagens que realizam mas nas relações que se estabelecem entre as pessoas e no acto comunicativo em si. Pelo trabalho em conjunto receberam prémios dos programas Visiting Arts e British Council e foram finalistas do Prémio Northern Art Prize 2009. Foram também, em 2010, comissionadas para desenvolver trabalhos na galeria Bluecoat, Liverpool; Besfast Exposed, Belfast; PSL Gallery, Leeds; Crunchtime, York. Além disso, Patricia Azevedo é professora de Artes Visuais na Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil e Clare Charnley professora de Belas Artes da Universidade de Leeds Metropolitan.


Rogério Nuno Costa (Portugal)
Vou à tua Mesa [do sensual absoluto e outras estéticas tecno-emocionais]

O projecto “Vou à tua Mesa” nasce no contexto da trilogia “Vou A Tua Casa” (2003/2006), uma performance teatral que acontecia nas casas dos espectadores, em espaços públicos à escolha do espectador e na casa do próprio criador. Foi durante o decurso da terceira fase do projecto “Vou A Tua Casa” (genericamente sub-intitulado “LADO C”, 2006), que o projecto “Vou À Tua Mesa” começou a dar os primeiros passos. A performance consistia na criação de um contexto relacional e conferencial que acontecia à mesa de uma refeição confeccionada pelo artista, simultaneamente anfitrião, orador, cozinheiro, mestre de cerimónias e moderador de uma reunião de trabalho ficcionada. A comida é, neste contexto, não só uma poderosa metáfora denunciadora dos conceitos de intimidade e de proximidade (caros a toda a trilogia), mas também o pretexto mais-que-perfeito para a concretização de uma ideia de performance teatral como “encontro”, utilizando o elemento específico da comida como dispositivo de revelação sensorial/sensitivo e como macro-conceito ao mesmo tempo performativo, ritualístico, visual e relacional.

Vive e trabalha em Lisboa, como artista, investigador e professor. É licenciado em Comunicação Social. Frequenta o Mestrado em Cultura Contemporânea e Novas Tecnologias. Trabalhou com o Teatro Praga, Sónia Baptista, Lúcia Sigalho, Alain Béhar, Rosa Coutinho Cabral, Nelson Guerreiro, Teresa Prima, entre outros. Colaborou ainda com várias companhias e estruturas, tais como: Alkantara, CCB, Centro em Movimento, Chão de Oliva, Festival Sonda, Quarta Parede, Transforma AC, APAP, [msdm], Buda Arts Centre, Dance Kiosk e Tanz Fabrik. Como criador, destaca os trabalhos: “Vou A Tua Casa — trilogia” (2003/2006), “Saudades Do Tempo Em Que Se Dizia Texto” (2003), “ACTOR” (2004), “Projecto de Documentação” (2006/2007) e “A Oportunidade do Espectador” (2007/2008). Actualmente, dedica-se à carreira de cozinheiro com o projecto “Vou à tua Mesa”.

http://www.rogerionunocosta.com


Josef Sprinzak (Israel)
Bedtime Stories & Lullabies

Uma série de performances íntimas em casas de famílias nas aldeias da região da Gralheira, na frente das crianças e dos pais. Como um performer e artista sonoro vocal, Josef Sprinzak irá a lugares de dormir privados, assumindo um papel entre o músico-poeta / contador de histórias e o “estranho” que executa peças vocais e acções rituais baseadas em línguas estrangeiras – principalmente hebraico, línguas irreconhecíveis e talvez um pouco de Inglês. A performance num quarto de dormir é um formato que explora a voz num contexto situado entre o funcional e o artístico, entre o reconhecido e o estranho. As sessões terão um carácter interactivo que irá exceder o padrão das relações teatrais performer / público, transformando-se em “eventos”, no sentido da tradição de performance art visual. Os eventos em quartos de dormir serão levados a cabo através do uso de objectos, fontes sonoras portáteis, actos vocais e troca de funções entre os participantes e o performer.

Josef Sprinzak é um artista performático e sonoro que vive e trabalha em Tel Aviv. A sua formação profissional inclui ciências da computação, teatro visual e trabalho vocal. Está entre os primeiros artistas de poesia textual / sonora em Israel e o seu trabalho consiste em notações precisas de linguagem, discurso gravado, vocalizações, gestos corporais, movimentos e relações espaciais, lidando com identidade privada e colectiva, as relações entre língua e história, consciência e memória.

http://www.myspace.com/josefsprinzak


Carmina Escobar (México)

Carmina Escobar propõe o desenvolvimento e realização de um concerto-performance, na busca da integração de diversos elementos, objectos sonoros e experiências, nas quais o espaço propõe a sua própria fala estética, o seu cunhado, principalmente sobre o envolvimento de uma narrativa pessoal e corporal e de uma linguagem sonora no âmbito da criação de um espaço cénico em que o ritual da performance em si é conduzido e ligado pela voz, seja na sua forma crua ou processada eletronicamente. O concerto – performance será desenvolvido, assim como uma instalação sonora, tendo como principal principal tarefa a ligação à comunidade como parte activa dos processos criativos que terão lugar no âmbito desta residência.

Carmina Escobar é uma cantora e artista multimédia oriunda da Cidade do México que tem colaborado em diferentes projectos, nos quais explora uma diversidade de linguagens sonoras, como a música medieval, ópera, música contemporânea, música folclórica, música eletrónica e tendências experimentais envolvendo colaborações interdisciplinares e multimédia. Como solista tem realizado concertos de repertório contemporâneo para voz solo, estreado de jovens compositores e realizado performances das suas próprias composições. Ela detém um mestrado em Performance Vocal pelo Instituto de Artes da Califórnia, focado em técnicas vocais estendidas, improvisação e performance interdisciplinar e multimédia.

http://www.carminaescobar.com


Toine Horvers (Holanda) e Myriam Van Imschot (Bélgica)
Walking, singing, talking the landscape

Ambos os artistas compartilham um interesse no som, linguagem e voz, no ponto de intersecção onde as pessoas e lugares se encontram. Para o programa de Residências Artísticas de Nodar eles gostariam de se envolver num mapeamento experimental da rede das “Aldeias de Magaio”, focado na interligação entre as aldeias da região e os respectivos arredores. As aldeias rurais são muitas vezes consideradas como sendo isoladas. No entanto funcionam numa rede complexa de movimentos, passagens, tráfego de desejos e de conhecimento, envolvendo seres humanos, animais, fauna e flora.

Toine e Myriam irão experimentar o movimento e as conexões das estradas com os caminhos alternativos ou secundários, abraçando os encontros acidentais no seu caminho. Isto levará a um trabalho sonoro e verbal, que pode envolver gravações sonoras, desenho, lidando com a elasticidade da distância e do tempo, a alternância de chegadas, partidas, transições, destinos, perdas, etc, numa paisagem em perpétuo movimento quando é atravessada.

Toine Horvers, um artista visual que trabalha com a linguagem e texto, através de formas visuais, audíveis e performativas. Toine confere à linguagem uma forma ritual, para criar esculturas temporárias a partir da linguagem, um gesto no espaço e no tempo. Apresenta as descrições de suas observações de situações e processos do mundo à sua volta, em diferentes media: performance (a solo ou em grupo), livros escritos à mão, instalações sonoras ou exibição de texto electrónico. A voz desempenha um papel essencial nas suas performances, o solo é o instrumento que determina o seu lugar no espaço. Em projetos e performances mais expandidos, a voz é o meio através do qual pessoas e lugares podem ser conectados, às vezes num único espaço, às vezes através de longas distâncias.

http://www.toinehorvers.nl/

Myriam Van Imschoot (1969) iniciu a sua prática artística e performativa com palestras  na forma de performances. Originalmente uma escritora, tem sido influenciada por artistas como Vito Acconci, o qual como poeta trocou a página por outros media. Nesse sentido, a artista olha para as passagens “escorregadias”, onde desliza em direcção a outros campos de expressão, muitas vezes desconhecidos para ela. O trabalho artístico que desenvolveu ao longo dos últimos anos com a série “Expanded Publications” envolve diferentes media e respectivas potencialidades sensoriais, tais como a performance, vídeo, e instalação sonora. Myriam Van Imschoot é responsável artística de Sarma (com Jeroen Peeters) desde 2003. Entre outras coisas, em 2010-2011, ela está desenvolvendo com o software online vzw Constant software, específico para publicação de áudio-documentação e poesia sonora.

http://www.sarma.be/nieuw/critics/imschoot.htm